Há exatos doze anos, o vovô Mario nos deixou aos 74 anos. Foi muito dolorido, só de me lembrar de como
transcorreu o dia de sua partida, dói até hoje. Naquele dia, aos dezesseis
anos, eu realmente descobri o que era saudade, o que era sentir aquele vazio,
aquela sensação de fim de mundo, de silêncio interno. Foi a primeira vez que me
vi deprimida de verdade, chorando pelos cantos e até sem me alimentar de tanta
emoção, de sentir sua ausência.
O vovô Mario Triguero era o mais novo de dez filhos (se não
perdi a conta). Era filho de um casal de espanhóis do Brás e ele mesmo enchia o
peito para falar que tinha nascido no ''Brais’’. Sempre me recebia na casa dos meus avós ou quando nos falávamos por telefone com um ‘’Oi querida’’. Ele era o meu
queridinho, porque a queridinha da minha irmã era minha avó, para não falar
puxa-saco. Adorava uma cervejinha, uma Bavaria, assistia o jornal do Boris
Casoy, ria de se matar assistindo Chaves
e quando começava a propaganda eleitoral deixava no mudo ‘’assim
não dá ibope’’, dizia.
Minha avó sempre o mandava lavar a louça, mas antes ‘’o vô
vai dar uma descansada’’, depois ele voltava para lavar a louça. Reclamava de
todas as pessoas do signo de aquário (o da minha avó) ‘’ que são terríveis’’.
Tinha uma frase dele que eu amava e nunca vou esquecer ‘’Feliz foi Adão, não
teve sogra, nem caminhão’’ e a forma de falar dele era muito engraçada. Eu adorava uma boina que ele tinha para usar no inverno e uma vez me pegou
brincando com o guarda-chuvas dentro da sala da casa dele (dentro de casa de
espanhol é proibido abrir guarda-chuvas, é sinal de má sorte). Todo aniversário ganhava uma pasta para
trabalhar ou um guarda-chuvas novo, mas teve um ano que foi um carro e não se
conteve de felicidade. O carro não era novo e isso era uma coisa que eu
admirava demais nele e que me serve de lição até hoje, ele era totalmente
desapegado dos bens materiais. Gostava de música, Andrea Bocelli, Luciano Pavarotti e assistia os calouros no Raul Gil.
Meu avô era espírita. Infelizmente gostaria de ter aprendido
mais da doutrina com ele. Pouco antes de falecer, me deixou dois livros do
Chico Xavier de mensagens ‘’leia uma por dia’’. Um deles me parece que está até com dedicatória.Estão guardados com muito carinho.
O vovô Mario falava que sonhava em conhecer a Espanha.
Quando faleceu, eu e minha prima Letícia dissemos que um dia faríamos essa
viagem por ele. Há três anos, eu tive a oportunidade de ir à Madri a trabalho
pela empresa. Quando soube da viagem não me aguentei de alegria, estava indo
realizar o sonho dele. O avião pousou e no aeroporto mesmo, olhei para o céu
azul e pensava ‘’Vô, tô aqui, vim realizar o sonho por você’’.
Ele vem me visitar às vezes em sonho. Conversa alguma coisa,
em alguns momentos só olha e em outros ri, a mesma risada que nunca vou
esquecer. Hoje agradeço demais a convivência dele na minha vida, por todas
essas boas lembranças, faz muita falta, mas rezo para que esteja bem e cuidando
de todos nós, onde quer que esteja meu querido!
Verão de 2000 em Ubatuba, a Miucha acabava de chegar na família (saudades da pequena também).